sábado, 3 de dezembro de 2022

 

MONTAIGNE E A SAÚDE

DE    NOSSO    TEMPO

 




 

 

 Tempos difíceis esses em que vivemos. Biblicamente são os primeiros passos dos fins dos tempos — os sinais preconizados pelo profeta João no Livro do Apocalipse.

Como nos preparar para as calamidades advindas? É o que nos preocupa a todos, quanto à nossa saúde mental, possivelmente abalada, se já não estamos todos loucos, o mundo todo enlouqueceu.

Sim, porque ocasiões há em que o ser humano já perdeu de vez a tramontana, basta verificarmos o grau de insanidade da chamada modernidade e seus estrépitos de desalinhos para com a natureza, a quebra da realidade e a deformação do próprio universo.

Se considerarmos as anomalias que nos assolam a atualidade, a insanidade de que tem se valido os atos humanos, os descompassos éticos, estéticos e morais dos seres humanos — a tudo isso só podemos chegar a uma conclusão: o mundo ficou louco e seus habitantes, também.

O Mestre já nos preveniu, preparando-nos para os novos, mas terríveis tempos de provação: “Orai e Vigiai”.

Neste ínterim, cai-nos à mão, advindo de um amigo, entrevista retirada do jornal francês Le Figaro, edição de 19.09.22 de um psiquiatra, Michel Lejoyeux. A entrevista é sobre seu livro “En bonne santé avec Montaigne”  — o subtítulo define o conteúdo do livro: Montaigne, um filósofo preocupado com nossa saúde. Em seu livro, o psiquiatra nos alerta: “Em Boa Saúde com Montaigne.”

Michel Montaigne (1533-92 foi um escritor francês, jurista, político e filósofo — teria sido inventor do gênero ensaio, considerado um dos mestres do humanismo francês. Resta dizer que Montaigne não era, por assim dizer, um bon-vivant, ao contrário era retraído e crítico da sociedade à época (século XVI), tendo por líder Boécio, com a pretensão de alcançar a verdade absoluta, conquanto duvidasse de tudo, o que contrariava seu suposto estoicismo. Na verdade ele não passava de um seguidor de Sócrates com o Conhece-te a ti mesmo, um casmurro, como Machado de Assis em seu Dom Casmurro.

Mas, Montaigne pode nos ajudar a entender esse nosso tempo louco? Esse parece ser o objetivo do livro do sr. Lejoyeux, que nos dá uma luz no fim do túnel.

Afinal o que nos legou esse senhor medieval, ensaísta famoso que possa nos ajudar hoje a viver esse nosso mundo e seus viventes?

Segundo a entrevista do Le Figaro, sim, parece que o velho caturra, autor dos Ensaios, o humanista boeciano,  nos traz algumas luzes. São conselhos, tirados à sua própria maneira de viver, recluso no seu Castelo, preocupado com suas biles.

Por que nos preocupar tanto com as mazelas do mundo? Devemos é alimentar nossa alegria interior, abolir as tristezas, afagar os mínimos prazeres, apreciar o que nos faz feliz e abolir por completo a infelicidade (chagrin)—esta, sim é a causa mais depressiva que existe.

Outra coisa interessante que nos aponta Montaigne, segundo Lejoyeux, é que nós, humanos, devemos ter poucos, mas amigos de verdade, os quais nos confortem com suas presenças,.ações e pensamentos e nunca cultivar numerosas amizades, tornam-se flibusteiros de plantão.

Por fim, outro conselho do velho mestre francês dos Ensaios — fazer exercícios corporais e diz ele: “Se você hesita entre fazer exercício físico e os do espírito, escolha o físico, pois o inverso não é verdadeiro.

Ficamos dando tratos à bola como Montaigne, velho, culto, jurista e filósofo dos costumes, diria diante desse espetáculo caricato que foi, durante um imbróglio político, um membro da alta corte de nossa justiça, responder a uma pessoa com esse chiste, absolutamente impróprio e chulo:

— ... Perdeu, mané!

Certamente teria vergonha de ter escrito seus Ensaios, afirmaria estar no planeta dos macacos, jamais no cadinho civilizatório sobre o qual urdiu suas reflexões.

 CDL/Bsb,4.12.22