Vivemos dias difíceis, o país
mergulhado numa espécie de convulsão na economia, na política, a sociedade
pasma diante do estado de choque em que se encontra. Será lícito – nos diz o
bom senso – toda uma Nação se vê sob tão repugnante situação e, mesmo assim,
permanecer calada?
O mesmo bom
senso parece nos sugerir que não. Ora,
se a razão que deve comandar a ação e uma vez que essa mesma ação se determine
ao largo da razão, então essa ação
tornar-se-á, no mínimo, inócua, posto que não orientada pela boa razão.
Diante desse
raciocínio, que se poderia dizer, intrinsicamente dialético, os governos só são
considerados justos, quando sua ação tenha como resultado o bem comum, a
felicidade dos governados, o bem estar geral da sociedade. É um princípio
básico, fundamento, por sinal, ínsito à própria democracia, como governo do
povo, pelo povo. Eis a essência da democracia grega, modalidade de governo
citada por Platão, ao lado da aristocracia gerida pelos nobres e aquela
contraponto à tirania, dos três regimes
o mais nefasto – segundo o filósofo. Observe-se, a propósito, que Platão se
inclinava para a república dos sábios e para ele a dita democracia seria regime
suscetível de contaminação. Muita gente hoje – constitucionalistas e sociólogos
ufanistas – desconhecem essa interpretação platônica ou ousam ignorá-la.
Queiramos ou
não, havemos de convir que nossa democracia se encontra doente, em estado de
paralisia, suas raízes sub-repticiamente contaminadas – e o pior tendente a se
transforar numa espécie de tirania socializante, em que o estado, sub-rogando-se
novo Leviatã, avassala seus súditos e os escraviza a uma ideologia que só
tresanda a atos e procedimentos arcaizantes, nos quais estão ínsitos paixões e
objetivos asfixiantes, lesivos à liberdade e absolutamente contrários aos
ideais patrióticos, cristãos e condizentes com o livre-arbítrio de
autodeterminação.
Ora, o que
vemos, em nosso País é um cenário absolutamente corrosivo, onde grassam o
vilipêndio, a falta de ética, o despudorado dilapidar dos bens públicos, como
método e ação corriqueiros. O que vemos, estarrecidos, não é só triunfar as
nulidades naquela previsão escatológica de Rui Barbosa, que tanto o apavorou,
no passado. È muito pior, estratosfericamente danoso: o que se vê é o roubo
descarado dos cofres públicos, o assalto armado de colarinho branco às
instituições, aos órgãos públicos e privados, sem nenhum pejo, às escâncaras,
inclusive à luz e sob a leniência da Justiça, da Lei, da Constituição.
Observem-se
isto, a propósito. O povo encontra-se acuado, desesperançado, de certo modo
traído por uma eleição contestável, cujo programa de ação é falível e
inexequível, por ineficiência e incapacidade de gestão, só tem uma saída
dignificante – protestar, em atos de inconformidade, nos panelaços, nos
buzinaços até culminar nas passeatas gigantes nas ruas.
Evidente que
somos avessos ao golpismo, ao intervencionismo irresponsável, conscientes de
nossas garantias constitucionais e republicanas, bens obteníveis ao longo de
nossa história. Mas, atentemos para o que grandes filósofos, católicos
inclusive, ensinaram a respeito do que seria “uma guerra justa”:
Diz Santo
Agostinho (sobe o livre arbítrio, I, 5,33, C.Chr. XXIX, 217):
“Não se vê ser
lei a que não for justa.”
Sobre a dita
“guerra justa”, explicita Agostino que os cristãos deviam ser pacifista, mas
podiam usar a força como meio de preservar a paz a longo prazo. O pacifismo,
argumenta, não é contrário à defesa dos inocentes ou à autodefesa, necessário,
às vezes, o uso da força.
Quanto à observância
das leis, refere o mesmo Agostinho, citando Atos 5,29: “É mister obedecer antes
a Deus que aos homens.” E doutrina:
“Se o povo é
bem moderado e grave, guardião diligentíssimo da utilidade comum, é reta a lei
que estabelece ser lícito a tal povo criar os magistrados pelos quais seja a
coisa pública administrada. Mas, se, paulatinamente, tal povo se deprava
tornando venal o seu sufrágio e confia o regime a homens ESCANDALOSOS e
CELERADOS, é correto tirar-se tal povo do poder de atribuir as honras, sendo
este de novo confiado ao arbítrio de uns poucos bons”. (sobre o livro-arbítrio,
1, 6,45.C.Chr XXIX, 219) – grifos nossos.
De sua vez,
Santo Thomás de Aquino, sobre se a lei humana deve ser mudada: “Deve dizer-se,
como se disse, a lei humana é corretamente mudada na medida em que por sua
mudança se provê a utilidade comum.”
Sobre a
tirania, o regime tirânico:
“... E, se é
insuportável o excesso de tirania, pareceu, a certos, competir ao valor dos
homens fortes matar o tirano e exporem-se aos perigos de morte pela libertação
da multidão, coisa de que há exemplo até no Velho Testamento” (Jz 3, 15-28).
O mesmo
filósofo denominado Angélico estabeleceu três condições que justificam à
chamada “guerra justa”:
(a) deve
ocorrer por causa BOA E JUSTA;
(b) ser
declarada por autoridade legal; e
(c) ter
como motivação central a PAZ.
Pensamos, com a devida reserva, que todas
as condições parecem justificar a irascibilidade atual do povo e arrastá-lo às
ruas, única ágora democrática justificável diante de tanta indecência, má
gestão, injustiça e irresponsabilidade
na gestão do Estado.
CDL/BSB, 13.08.15
Nenhum comentário:
Postar um comentário