O OUTRO LADO DO PRÊMIO NOBEL
Com
a recente concessão do Nobel de Literatura ao compositor americano de música
folk e rocking’ roll, Bob Dylan – não nos causará espanto se o criador e
benfeitor do Prêmio Nobel, o milionário sueco
Alfred Nobel, tenha se revolvido no seu túmulo, de indignação.
Indignados
também estamos nós, escritores e cultores da arte de escrever com tão
estapafúrdia escolha, fora dos padrões de qualquer mérito a ser concedido às
letras. Afinal qual o motivo de premiar um cantor de baladas countries, propalado
na mídia americana e internacional, tendo abocanhado inclusive prêmios como o
Grammy de Música, o Globo de Ouro, o Pulitzer e recentemente em 2012 a Medalha
Presidencial da Liberdade, concedida pelo Presidente do Estados Unidos, Barack
Obama? A secretária da fundação sueca, Sara Danius justificou a premiação de
Bob Dylan por ele criar versos não para serem lidos, mas ouvidos acompanhados
de música, segundo ela – pasmemos todos nós – “na tradição de Safo e Homero”.
Quer dizer, o cantor de baladas folclóricas, na onda da contracultura dos anos
60 e 70, embalado no LSD e nos rebeldes de Woodstock, sem mais nem menos, é
equiparado repentinamente a Homero, suposto autor das obras-primas Ulysses e
Odisséia. No raciocínio dos promotores do Nobel, também seria equiparado a
Miguel de Cervantes, com Dom Quixote e
Luís de Camões, com os Lusíadas.
E
a escolha se torna ainda mais absurda senão incauta, se verificarmos os escritores
que foram preteridos, embora indicados:
-
Svetlana Aliksijevit, jornalista e
poeta ucraniana, com livros sobre a
segunda Guerra Mundial;
-
Haruki Murakami, escritor japonês
muito popular, jornalista e com obra prolífica;
-
Ngug wa Thiong’ o, escritora
queniana, lutou pela independência do Quênia;
-
Phillp Roth, premiado autor
americano, com 83 anos, notabilizou-se com o livro “O Complexo de Portnoy”;
Joyce Carol Oates,
americana, publica livros desde 1963, premiado pelo National Book Award (1969),
professora na Princeton University;
-
Ismael Kadare, albanês, perseguido
pelos comunistas exilou-se na França, onde vive, com vários prêmios e
indicações ao Nobel;
-
Jon Fosse, jornalista norueguês,
autor de novelas e contos, Cavaleiro da Ordem Nacional do Mérito da França;
-
Ko Un, autor sul-coreano, traduzido
em mais de cinquenta idiomas, indicado mas nunca premiado;
-
Liter Handke, austríaco, com vários
prêmios, o mais recente o “International Ibsen Award”, novelista, também
indicado, sem êxito.
A
crua realidade é que esse famoso prêmio Nobel vem caindo, de certo modo, senão
no ridículo, no mínimo desacreditado. Haja vista a premiação recente atribuída à
categoria Paz: dentre cerca de 376 candidatos, dentre eles até o Papa
Francisco, eis que foi galardoado nada menos que o presidente da Colômbia Juan
Manuel Santos e o líder da FARC, Timoleon Jimenez, pelo suposto pacto de paz
entre o governo colombiano e os
terroristas de uma facção criminosa, responsável inclusive pelo sequestro de
3.000 crianças, que não foram sequer objeto do tal pacto de paz! E mais: o
suposto “pacto” foi vergonhosamente rejeitado em plesbicito pela população
colombiana!
Com
muita clareza contra essa premiação ao bardo da contracultura, quem melhor se pronunciou foi o escocês
Irvine Welsh: “Sou fã de Dylan, mas esse
prêmio é apenas uma nostalgia equivocada e rançosa das próstatas senis de
hippies delirantes.”
Ora,
convenhamos, discografia, letras de música, baladas, cantarolas e cantorias,
não há como classificá-las como literatura, senão daqui a pouco pleitearão o
Nobel – e com muita razão – esses rapers de rua, cancioneiros de meia tigela, e
por que não nossos cordelistas do sertão?
CDL/BsB.,16.10.16