sábado, 16 de maio de 2020



IMAGINÁRIO DE

        UMA PANDEMIA








O que fazer numa paralisação pandêmica como a que vivemos agora? Dormir o tempo todo? Esbravejar contra o Governo, as estrepolias da oposição, inventando mentiras para apear o Presidente eleito do poder?
Tempos difíceis esses, tenebrosos mesmos que estamos a viver. Será que nosso País e o mundo todo foram pegos de outra espécie de epidemia, o histerismo coletivo de loucura viral?
Senão vejamos. Grassa a anarquia entre os políticos, tudo vale tudo entre os pares. Não se sabe mais o que é mentira e o que é verdade, foro íntimo não interessa, todos usam máscara, a persona do que é sibilino, para a política e  a sociedade — não só para supostamente nos prevenir contra o Covid-19, mas nos blindar de nossa própria insânia. Estamos todos à beira do niilismo escatológico dos últimos dias. Exagero ou realmente indícios dos prolegômenos apocalípticos?
Praza aos céus que tudo não passe de um pesadelo, que atravessamos a duras penas — águas passadas não movem moinho, mas desta feita parece que sim, movem consciências ou removem entulhos de proficiências negativas. Sabe-se lá quanto e como.
O que fazer? É o que aconselhamos: primeiro, desanuviar a mente, desacreditar na mídia falada e escrita. Desenvolver nosso tirocínio, para além do raciocínio relativista. Ler os clássicos, por exemplo:  Tolstói, Dostoiévski, Goethe, Byron, Shelley, Shakespeare. Mas as bibliotecas, esses templos do saber, estão fechadas, os autores novos podem atender nossos anseios literários, caso tenhamos um punhado deles à mão.
Relembremos aquela escritora provinciana, maranhense da antiga Província de Guimarães — Maria Firmina dos Reis, resgatada há pouco tempo do anonimato. Afrodescendente,  pobre, professora interiorana, assim mesmo ela escreveu um romance em 1859, Úrsula, e o publicou, certamente com ajuda de alguém importante, pois sem recursos. Fala-se em Sotero dos Reis  tê-la ajudado, erudito, lexicólogo, prestigiado na Capital ludovicense à época,  por ser sua parenta distante. Talvez seja a primeira mulher negra a escrever sobre a escravidão no Brasil. Interessante seu romance, estilo ultrarromântico, talvez cinzelado, aqui ou ali, no Cabana de Pai Tomás, obra viralizada no início do século nos Estados Unidos.
De nosso pequena estante, retiro um dos favoritos: Machado de Assis, velho conhecido, seus maravilhosos contos: Missa do Galo, Religião do Diabo, O Espelho  e tantos outros de sua inventiva. Romances: Dom Casmurro, Helena. A Mão e a Luva, Obras Póstumas de Brás Cubas, Esaú e Jacó — incomparáveis.
Mas colhamos escritores mais novos. Vem-nos à mente logo Lygia Fagundes Telles, estilo mágico, prosa primorosa. Outra é Clarice Lispector com seus contos fantásticos, suis-generis. Na mesma linha, o chamado realismo mágico brasileiro, da estante retiro José J. VeigaA Hora dos Ruminantes, A Casca da Serpente, este tenho autografado pelo autor.
Uma visita aos escritores maranhenses. Em mãos a obra-prima de Josué Montello, Os Tambores de São Luís,  obra de fôlego, uma viagem magistral através da cultura ludovicence. Outro não menos importante é João Mohana, médico, escritor e sacerdote: O Outro Caminho e Maria da Tempestade. Bom relê-los, Mohana inclusive foi premiado pela Academia Brasileira de Letras.
 Não só de pão vivemos, obtemperam as verdades evangélicas pela voz do Mestre da Galileia. Alimentar o espírito também é uma opção para garantir nosso poder de reflexão, tal qual a busca pela verdade, o valor como medida valorativa da justiça e do bem no mundo. Este é o assunto que nos desvia da literatura para a filosofia. E eis um livro precioso que encontro na estante, algum tempo esquecido — Filosofia dos Valores, o autor professor e filósofo alemão Johannes Hessen. Minucioso estudo sobre o que é o valor e sua aplicação à nossa vida, pois, segundo o erudito mestre alemão, é o valor e não o homem a medida de todas as coisas como preconizou, erroneamente,  o pré-socrático Protágoras de Abdera (481-411 a.C).  
São estas as reflexões que nos impõe, por enquanto, esse extemporâneo isolamento das coisas e do mundo. 
CDL/Bsb, 17.05.20