terça-feira, 20 de outubro de 2020

 

FRATELLI  TUTTI  - 

ENCÍCLICA CATÓLICA?

 

 

 

Tem sido matéria viralizada nas redes sociais a encíclica publicada pelo Papa Francisco no dia 4 deste mês, no Mosteiro de São Francisco de Assis. Com o sugestivo título de Fratelli TuttiTodos Irmãos — é constituída de oito capítulos, distribuídos em 285 tópicos. A primeira voz que se levantou contra a encíclica foi do Mons. Carlos Maria Viganó, prelado dos Estados Unidos. Faz crítica contundente a todo o conteúdo da encíclica, imputando de herética a doutrina que ali inspira. Outros religiosos têm-se pronunciado, inclusive o Frei Tiago de São José, da Ordem do Carmelo, Bragança Paulista. A ponto de nas redes viralizar a informação de que há cerca de 1.000 religiosos contra os atos, como esse da encíclica, do Papa Francisco.

Por enquanto, vamos nos ater às inovações constantes da nova encíclica. Claro que não temos o conhecimento teológico do Mons.Viganó, nem a coragem de Frei Tiago — este envolvido em imbróglio religioso por Bispo da Diocese de São Paulo — o que não nos impede, como leigos da Igreja Católica, de nos mantermos alertas e não nos eximirmos de exercer nosso dever como tal, nos termos do Catecismo Católico, item 897 e seguintes.  

Logo no prefácio, a encíclica conclama a todos — católicos e não católicos, de fé cristã, ortodoxa ou de outros credos, mulçumanos, ateus, revolucionários e anarquistas — “ ... Sonhemos com uma única humanidade, caminhantes da mesma carne humana, como filhos desta mesma terra que nos alberga a todos, cada qual com a riqueza da sua fé ou das suas convicções, cada qual com a própria voz, mas todos irmãos.”  É um verdadeiro hino à fraternidade universal, uma exortação ao conúbio em relação a todos os terráqueos, sejam alhos ou bugalhos, sem distinção de credo, cor, convicções e que tais. Ora, a fraternidade evangélica,  assumida pelo dogma católico,  não nos parece coadunar com essa fraternidade horizontalizada abraçando todos os povos, indiscriminadamente. Uma coisa é sermos fraternos com todos, não os odiarmos, mas isto não significa aceitarmos os erros, desvios e a diferença que separa o crente em Deus com o descrente, adepto ao materialismo, ritos e costumes híbridos — seria praticamente aderirmos à barbárie.

Segue-se saudação à trilogia iluminista, haurida na Revolução Francesa — e também lema da Maçonaria Universalliberdade, igualdade e fraternidade. A saudação soa-nos imprópria, até fora de propósito, hoje, num mundo inflado de tecnologia, a chamada aldeia global, com diversidade de interesses e proposições, muitas vezes discordantes, apenas vinculadas pela extraterritorialidade, discordantes em usos e costumes et allia.

Outra hibridez do Papa: como considera os direitos individuais — (item 111) ... “envolve uma concepção de pessoa humana separada do todo o  contexto social e antropológico, quase como uma mônada “manás”, cada vez mais insensível...” Ora, o direito individual é imprescindível à pessoa humana, direito inalienável ou na comparação iluminada de G.K.Chersterton de que a pessoa na vida e no mundo tem o direito mínimo de possuir um alqueire e uma vaca, para se assumir como ser humano.

A encíclica propugna pelo  enlace entre as culturas ocidentais e orientais, resultante de acertos entre o Papa e Imã Ahmas Al-Tayyed — é o que dispõe o itens 136 e 141. Temos que nos irmanar com os terroristas islâmicos, pois “... Só poderá ter futuro uma cultura sociopolítica que inclua o acolhimento gratuito.”

Como se obteria essa futura fraternidade universal? Segundo a encíclica: “O caminho para a fraternidade é necessário uma política melhor, a serviço do bem comum” (item 154). Para atender as exigências dessa política melhor a legislação específica das nações teria que se adaptar a elas, os conflitos seriam inevitáveis.

Sobre a filosofia liberal, a encíclica a acusa de vários defeitos: item 167: “Há visões liberais que ignoram este fator da fragilidade humana e imaginam um mundo que corresponde a uma determinada ordem, que, por si só, poderia assegurar o futuro e a solução de todos os problemas”. Visões liberais? Quer dizer que os liberais não têm condições de melhorar o mundo, só a esquerda, os movimentos globalistas o fazem? Enquanto no item 168, acusa o dogma de fé liberal de ... “um pensamento pobre, repetitivo que propõe as mesmas receitas perante qualquer desafio que surja.” E mais adiante: “O neoliberalismo reproduz-se sempre igual a si mesmo, recorrendo à mágica teoria do derrame ou do gotejamento  sem nomear — como única via para resolver os problemas sociais. Por conseguinte, só o socialismo, o globalismo ideológico  é que são ricos em solução dos problemas, só eles propiciam a salvação do mundo?

E vai mais além a encíclica supostamente progressista do Papa Francisco: a recomendação de uma nova ordem... “os Movimentos Populares”, capazes de “animar as estruturas de governos locais, nacionais internacionais com aquela torrente de energia moral que nasce da integração dos excluídos na construção do destino comum “(item 169). É a confirmação do pensamento socialista do Papa — apoia movimentos, ditos sociais, como o MST no Brasil? Não há absurdo maior.

Quanto à globalização, o Papa a defende como capaz de acabar com a fome no mundo, evitar o desperdício  de alimentos, bem como conter o tráfico humano (item 189). Ora, a realidade tem sido bem diferente, o movimento mundialista acaba com as fronteiras das nações, facilitando o tráfico, anulando as legislações nacionais, sem falar que destrói culturas desqualificando suas motivações, inclusive o amor à pátria.

Já noutro item, a encíclica aborda o tema “Diálogo e Amizade Social”, anatematiza a falta de diálogo no sistema atual, o que, ao contrário, seria acolhido plenamente com a globalização (item  202), diálogo este que visaria o bem comum. Não seria o reverso, não passaria de um monólogo monocrático pela ideia socialista,  tudo sendo nivelado por baixo, política, religião, pensamento e atividades?

O assunto agora é a paz, para a qual se faz necessário  uma “arquitetura da paz” sustentada por um suposto “artesanato” a envolver a todos (itens 231). O que significa arquitetura da paz? Um complô visando a implantação do globalismo, uma política audaciosa de transformação planetária segundo a ideologia  social-democrática? Para apoiar essa tal “arquitetura da paz”, a encíclica recomenda que os ocupantes de cargos importantes se tornem os “principais protagonistas do destino da própria nação” (referência a discurso do Papa no encontro com autoridades do corpo diplomático da sociedade civil,  em Matuto, Moçambique, em 5.09.19 – cfe. Osservatore Romano). Uma incongruência, pois como num mundo globalizado, através do qual as nações são massificadas, pode gerar o protagonismo desta ou aquela nação? A rigor, as nações estariam totalmente apagadas.

No item 238, a tecla é a violência e a encíclica adverte: “Jesus Cristo nunca convidou a fomentar a violência ou a intolerância.”  Observe-se, a propósito, que Jesus em seus ensinamentos, como mandatário divino, sempre age com justiça não aceitando generosamente o erro, o pecado, a ignomínia. Em Mt.10:34-36, Ele alerta que não veio para a paz, mas para a espada; em Mt.21: 12 e Mc 11:15-17, expulsa os vendilhões do templo, por difamá-lo. Também no caso da mulher adúltera, quando a livrou de ser apedrejada pelos fariseus seguindo a lei judaica (Jo: 8-11), observe-se que a admoestou: “Vai e não peques mais!”, isto é, se ela continuasse a pecar, não seria perdoada — é o perdão responsável!

Já na sua parte final, o Papa trata do que ele diz ser “A Injustiça da Guerra” , enquanto no item 258 assinala: “O Catecismo da Igreja Católica fala da possibilidade de uma legítima defesa por meio da força militar, o que supõe demonstrar a existência de algumas “condições rigorosas de legitimidade moral” (CIC – 2039). A encíclica parece ser totalmente contra a qualquer espécie de guerra, o que, de certa forma, contradiz o disposto no Catecismo da Igreja, regra fundamentada em Sto. Tomás de Aquino, em sua Suma Teológica – Parte II Questão 40 — por onde aceita a chamada guerra justa, desde que tenha três requisitos: a) autoridade do governante; b) causa justa e c) promova o bem comum para evitar o mal. O Para Francisco para ser mais realista do que o rei desrespeita a justiça crística da contemporização responsável.

Por final, nos itens 285 e 287 o Papa enfeixa sua encíclica, a título de chave de ouro, com seu apelo apologético à “fraternidade universal” , tomando emprestado, intempestivamente, a vivência de São Francisco de Assis — em cuja vida glorificou a natureza, mas não a apoplexia do naturalismo e  o compara com outros irmãos não católicos: Martin Luther King, Desmond Tutu, Mahatma Gandhi e outros que tais.

Em linhas gerais e sem escoimá-la  de muitos outras distorções, ali contidas, esta foi a má impressão que nos causou a última encíclica do Papa Francisco — Fratelli Tutti — Irmãos Todos, uma mistura de  alhos com bugalhos tudo junto no oceano da mais falsa das fraternidades: o Condomínio da Permissividade Universal.

                                                                              Em 20.10.20