A RETÓRICA E A PROLIFERAÇÃO
RELIGIOSA
Certa
feita — e já não faz tanto tempo — eu e um amigo jornalista investigativo
discutíamos sobre a proliferação das denominações religiosas no Brasil.
Interessado no assunto, revelou-me que em pesquisa realizada a cada hora o CNPJ registra uma nova
denominação religiosa no Brasil e até fevereiro deste ano contabilizou, só no
Rio de Janeiro, 21.333 organizações.
O
feito não só nos assombra pela quantidade, mas também de certo modo desmoraliza
a Religião como fator integrante da cultura humana. É de estarrecer como as
seitas religiosas se multiplicam na sociedade, notadamente nas árias
periféricas, ao que tudo indica onde o conhecimento e a cultura são parcas, as
pessoas sem grandes luzes para discernir a verdade do sofisma, mesmo em matéria
de religião. Sem falar que também vicejam nessas áreas inúmeras correntes ditas
espiritualistas, como Budismo, Nova Era, Teosofia, Sacha-Noi-É, Umbandismo, Candomblés,
Xamanismo, Espiritismo e quejandos.
Para
se ter uma ideia de como essas noveis seitas perderam o senso, observem-se
algumas com nomes esquisitos: Funerária
Marcos de Jesus; Associação Missionaria Boneka; Igreja Missionária As Bordas do
Inferno; Igreja Protestante Escatológica (funcionando na casa de seu fundador);
Ministério Alfa Ômega; Associação de Deus Derrubando Muralhas em Irajá; Ministério
Para que Ele Cresça; Igreja Pentecostal A Marca do Sangue.
Bem
a propósito desse verdadeiro derrame de seitas — o que não é privativo do
Brasil, mas do mundo — em minha pauta de leitura tenho o livro O Mundo e Eu do escritor maranhense João Mohana, já falecido, mas ainda uma
referência em matéria religiosa, sendo ele vigário e psiquiatra. O educador
disseca, com grandeza e eficiência apostólicas, o tema Cristianismo,
enaltecendo suas qualidades e demonstrando tratar-se de o melhor caminho para o
crescimento espiritual do ser humano, perdido num mundo desnorteado e sem
sentido verdadeiro do que seja sua vida.
Tenho
de mim, para mim, que a religião tem dado margem a tal desmando por uma razão:
o que se poderia eufemisticamente dizer o uso e o abuso da retórica na religião. Explique-se. Retórica é uma técnica milenar,
vem do grego rhêtorkê, do substantivo rhêtor (orador) que significa a arte
de usar a linguagem para se comunicar persuasivamente. Teria nascido na
Sicília, introduzida na Grécia por Geórgias, um grande sofista. Seria a arte de
falar bem, movimento criado pelos filósofos chamados sofistas, aos quais em toda vida se opôs veementemente o grande
Sócrates. Aristóteles teria sistematizado a Retórica, como um dos
elementos chaves da filosofia junto a Lógica e a Gramática, apenas segundo
aquele filósofo a Retórica envolvia-se com assuntos práticos, ou seja, relativos
à vida pragmática, enquanto a Dialética, também meio de comunicação, mas em termos
teóricos, buscava a Verdade.
Ora,
na verdade, a antiga Retórica Aristotélica evoluiu com o tempo, já sob a
influência do iluminismo, para se
transformar num sistema de Persuasão e modernamente, mediante oratória
especializada, acabou se transformando num canal de Propaganda — pelo qual
as pessoas tentam, com argumentos hipotéticos e fantasiosos alcançar seus
objetivos falaciosos, criando seitas as mais absurdas. Nos Evangelhos, o Mestre
designou essa trupe de falsos profetas. Pois são esses
modernos sofistas que enxameiam o mundo dessas seitas supostamente miraculosas,
inclusive as que pregam o enriquecimento pessoal em nome de Deus. As pessoas
são sugestionadas por essas seitas através da persuasão dos tais “obreiros” com
suas oratórias encantatórias — isto é o que denominamos a nova Retórica.
É
nessa retórica de persuasão que muita gente, até mesmo com certo grau de
conhecimento, se vê envolvida e acabam sendo porta-voz de conceitos e teorias
sem fundamento aceitável. Muitas dessas falácias, geradas no seio dessas
fantásticas seitas, são frutos do deslumbramento pessoal, conhecimentos
errôneos, falta de bagagem cultural e acreditar na doutrina da
desmaterialização ideológica do ser humano, discordante das verdades crísticas
e filosóficas.
CDL/Bsb,
27.07.18