quinta-feira, 26 de julho de 2018





A RETÓRICA E A PROLIFERAÇÃO RELIGIOSA



Certa feita — e já não faz tanto tempo — eu e um amigo jornalista investigativo discutíamos sobre a proliferação das denominações religiosas no Brasil. Interessado no assunto, revelou-me que em pesquisa realizada  a cada hora o CNPJ registra uma nova denominação religiosa no Brasil e até fevereiro deste ano contabilizou, só no Rio de Janeiro, 21.333 organizações.
O feito não só nos assombra pela quantidade, mas também de certo modo desmoraliza a Religião como fator integrante da cultura humana. É de estarrecer como as seitas religiosas se multiplicam na sociedade, notadamente nas árias periféricas, ao que tudo indica onde o conhecimento e a cultura são parcas, as pessoas sem grandes luzes para discernir a verdade do sofisma, mesmo em matéria de religião. Sem falar que também vicejam nessas áreas inúmeras correntes ditas espiritualistas, como Budismo, Nova Era, Teosofia, Sacha-Noi-É, Umbandismo, Candomblés, Xamanismo, Espiritismo e quejandos.
Para se ter uma ideia de como essas noveis seitas perderam o senso, observem-se algumas com nomes esquisitos: Funerária Marcos de Jesus; Associação Missionaria Boneka; Igreja Missionária As Bordas do Inferno; Igreja Protestante Escatológica (funcionando na casa de seu fundador); Ministério Alfa Ômega; Associação de Deus Derrubando Muralhas em Irajá; Ministério Para que Ele Cresça; Igreja Pentecostal A Marca do Sangue.
Bem a propósito desse verdadeiro derrame de seitas — o que não é privativo do Brasil, mas do mundo — em minha pauta de leitura tenho o livro O Mundo e Eu do escritor maranhense João Mohana, já falecido, mas ainda uma referência em matéria religiosa, sendo ele vigário e psiquiatra. O educador disseca, com grandeza e eficiência apostólicas, o tema  Cristianismo, enaltecendo suas qualidades e demonstrando tratar-se de o melhor caminho para o crescimento espiritual do ser humano, perdido num mundo desnorteado e sem sentido verdadeiro do que seja sua vida.
Tenho de mim, para mim, que a religião tem dado margem a tal desmando por uma razão: o que se poderia eufemisticamente dizer o uso e o abuso da retórica na religião. Explique-se. Retórica é uma técnica milenar, vem do grego rhêtorkê, do substantivo rhêtor (orador) que significa a arte de usar a linguagem para se comunicar persuasivamente. Teria nascido na Sicília, introduzida na Grécia por Geórgias, um grande sofista. Seria a arte de falar bem, movimento criado pelos filósofos chamados sofistas, aos quais  em toda vida se opôs veementemente o grande Sócrates. Aristóteles teria sistematizado a Retórica, como um dos elementos chaves da filosofia junto a Lógica e a Gramática, apenas segundo aquele filósofo a Retórica envolvia-se com assuntos práticos, ou seja, relativos à vida pragmática, enquanto a Dialética,  também meio de comunicação, mas em termos teóricos, buscava a Verdade.
Ora, na verdade, a antiga Retórica Aristotélica evoluiu com o tempo, já sob a influência do iluminismo,  para se transformar num sistema de Persuasão  e modernamente, mediante oratória especializada, acabou se transformando num canal de Propaganda — pelo qual as pessoas tentam, com argumentos hipotéticos e fantasiosos alcançar seus objetivos falaciosos, criando seitas as mais absurdas. Nos Evangelhos, o Mestre designou essa trupe de falsos profetas. Pois são esses modernos sofistas que enxameiam o mundo dessas seitas supostamente miraculosas, inclusive as que pregam o enriquecimento pessoal em nome de Deus. As pessoas são sugestionadas por essas seitas através da persuasão dos tais “obreiros” com suas oratórias encantatórias — isto é o que denominamos a nova Retórica.
É nessa retórica de persuasão que muita gente, até mesmo com certo grau de conhecimento, se vê envolvida e acabam sendo porta-voz de conceitos e teorias sem fundamento aceitável. Muitas dessas falácias, geradas no seio dessas fantásticas seitas, são frutos do deslumbramento pessoal, conhecimentos errôneos, falta de bagagem cultural e acreditar na doutrina da desmaterialização ideológica do ser humano, discordante das verdades crísticas e filosóficas.
CDL/Bsb, 27.07.18

Um comentário:

  1. Aqui no bairro onde moro, em Olinda, cresceu bastante o número de igrejas, a maioria Evangélicas seguidas de Espiritas e Umbandistas, só na minha rua existem 3 Evangélica, e num raio de 500 mts, não contei, mas são mais de 10.
    Um dos motivos, não tem nada haver com religião, mas sim o aspecto unicamente financeiro, passou a ser meio de vida. Muitas dessas denominações tem como sede a própria residência do fundador, aproveitando assim da lei que isenta da cobranças de imposto (IPTU) e acho que outros benefícios

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