terça-feira, 24 de setembro de 2024

                                   ENRAIZAMENTO E PERSONALISMO

             — ESTRATÉGIAS  CRÍSTICAS

 



        Simone Weil (1904-43) e Emmanuel Mounier (1905-50) foram dois filósofos franceses que nos legaram duas contribuições, a nosso ver, muito importantes ao ideal cristão. Sobretudo devido a influência que os dois pensamentos influíram num período agônico da civilização dita ocidental, as duas guerras mundiais, vertentes e decorrentes do comunismo stalinista e nazismo de Hitler.

Os dois, em tempos obscuros, nos quais prevaleciam o ódio e a violência, o mundo em estado de apatia, onde o medo e a paralisia mental e filosófica grassavam, ante essas duas catástrofes, não só físicas como filosóficas, os dois Simone Weil e Emmanuel Mounier tornaram-se, por assim dizer, os baluartes desse pensamento novo, dessa filosofia que sob os aportes de dois grandes pensadores, ousavam desafiar essas catástrofes, com diretrizes calcadas na razão,  no sentimento e sobretudo estimuladas pela  fé, a preconizar uma renovação  no cristianismo. 

Embora sem nunca terem se encontrado, os dois filósofos, a professora recém-formada Simone Weil, judia e recentemente aderente aos ideais cristãos e Emmanuel Mounier, jornalista combatente, filósofo, altruísta e defensor da liberdade, juntaram seu idealismo, para se oporem à violência, ao tribalismo então vigente, seja do lado alemão e seus comparsas e o terrorismo crescente do comunismo na Europa e no mundo.  

De um lado, Weil calca-se  no pensamento de Sócrates, Aristóteles e Platão,  mas de visão mais moderna, impregna-se dos ditames socialistas em  voga, enquanto procura  uma saída, diríamos  místico-realista, em face da violência  de um capitalismo selvagem crescente e o aforismo anunciado pelo marxismo supostamente salvacionista. Crê-se, em princípio, defensora da classe trabalhadora, inclusive como operária de um fábrica, depois, adere  aos atavios ilusórios do socialismo,  inclusive,  participa da Revolução Espanhola, da qual foge decepcionada e frustrada em todos os sentidos. Já de certo modo convertida às ideias cristãs, Weil cria uma filosofia própria, de um heroísmo brilhante, capaz de agir como salvação para o crescente materialismo, enquanto os preceitos evangélicos perdem sua energia mística. É o que ela em livro modelar denomina de a teoria do Enraizamento, força místico-religiosa capaz de unir as pessoas, as classes sociais e dar-lhes o vigor  necessário de transformação das sociedades  até capaz de elevar o mundo, então em crise.

Já Mounier, por circunstância do destino, sem nunca ter se encontrado com Weil, embora vividos à mesma época, foi um jornalista combatente, de ideário cristão, educado em família católica, desde cedo defendeu os ideais evangélicos. Fundou um jornal Le Spirit, no qual combatia com fervor os ideais de fraternidade, sobretudo defendendo a liberdade, ante a violência das correntes oportunistas, o socialismo e os regimes de força que iniciam viger à época, como o nazismo hitlerista e o regime de Mussolini na Itália. Como defensor tenaz da liberdade, prerrogativa essencial ao ser humano, Mounier, também filósofo, fundamenta suas ideias liberais na  teoria que denominou Personalismo Cristão . Segundo ele, o ser humano é dotado de personalidade totalmente livre, imune a qualquer outra força que  ofenda  a sua personalidade, seu eu interior cujo lema é a liberdade. Sua personalidade livre não o força, no entanto, a se confiar ao outro, a se mostrar altruísta e nobre respeitando as pessoas, isto é, ser solidário, em atos e pretensões. O personalismo teórico de Mounier não o priva, entretanto, de acreditar nos benefícios criados pela modernidade, e não se tornar retrógrado. Em seu famoso livro, que consideramos sua obra prima Le Petit Peur du XX éme Siécle — Mounier nos dá uma aula de modernidade, inclusive prevendo as benfeitorias da máquina, como um dos maiores instrumentos da civilização moderna. Compara nossos braços e pernas como máquinas, máquinas da evolução do ser humano, iguais aos instrumentos maquinicos das invenções humanas.

A nosso ver, a traços evidentemente muito largos quanto as duas formulações filosóficas, os dois reconhecidos apóstolos modernos do cristianismo, Weil e Mounier, nos bastam para considerar as duas proposições fundamentais, se quisermos  obter uma resposta construtiva, visando uma sociedade mais justa, e ao mesmo tempo progressista, sem nos envolver no cientificismo materialista e relativista. Ao mesmo tempo — claro que teoricamente — seria talvez a solução mais viável de melhoria de nosso problemático mundo. Quem sabe não aderíamos  a velha, mas belíssima saída, preconizada por Leibniz de o mundo possível, que não discorda muito do Novo Reino previsto messianicamente pelo Mestre dos Mestres nos Evangelhos.


Bsb, 25.09.24


 


quinta-feira, 19 de setembro de 2024

                          LONGA PÉTALA DE MAR

— EPOPEIA OU TRAGÉDIA?

 

                                                     Murilo Moreira Veras

 

O livro em discussão no próximo dia 26.09.24 no Clube do Livro é da escritora peruana Isabel Allende com o título Longa Pétala de Mar. Informo que não foi minha opção.

1.    Prólogo

 

Na realidade o livro é a história, romanceada, da Guerra Civil Espanhola, ocorrida em 1936 e finda em 1939 — portanto três anos de violência, mortes, brutalidade de ambos os lados do entrevero, tanto do General Franco, quanto dos chamados republicanos, alinhados ao comunismo mundial. Franco, referem os historiadores, aliado ao nazismo de Hitler e ao ditador Mussolini, enquanto os ditos republicanos, tutelados pelo comunismo de Stalin. A guerra deixou um saldo de cerca de 2 milhões de mortos, segundo a Wikipédia.

 

2.    À guisa de Enredo

 

Numa atmosfera de romance trágico,   a autora cria uma narrativa tendo como pano de fundo a guerra que inundou a Espanha de sangue, abalando o mundo por idealismos partidaristas. O ator principal que transita por toda a tragédia é Victor Dalmar e sua família, ele combatente ao lado dos republicanos, primeiro como paramédico, depois médico formado. Ele e familiares, envolvidos. O irmão Guillem curte a violência, acaba se casando com Roser, uma moça abandonada, criada em convento de freiras, mas maltratada e até vilipendiada. Pai e mãe unidos pelo mesmo ideal de liberdade, ambos agnósticos, contra o catolicismo e crentes na solução de que serão libertos pelo comunismo universal. Traídos por Stalin, que abandona seus pupilos e atraídos por uma fé num suposto companheirismo universal, na realidade não passando de utopia, os tais revoltosos perdem o entrevero, cruelmente. E então surge o salvador da pátria no imbróglio, espécie de herói épico — Pablo Neruda, poeta chileno, prêmio Nobel. Com a derrocada total dos revolucionários, embaixador do Chile à época, Neruda ajuda a transportar os desterrados da guerra para o Chile, que os aceita, graças a autoridade do famoso poeta. Então, os imigrantes, refugiados da guerra civil, são levados para o Chile.

O título do livro a autora retira de trecho de poema de Neruda — longa pétala de mar — o navio que transporta os imigrantes tem o nome  de Winnepig, cujo capitão odiava comunistas e suspeito de que desviaria o curso do tal navio, mas que, afinal, foi absolutamente correto na empreitada. Os agora apátridas foram recebidos com ovações populares, graças a Salvador Allende, pouco depois tornado Presidente do Chile.

No Chile, Victor Dalmau é muito bem recebido, com emprego como médico, já formado, graças a Allende, do qual se torna amicíssimo, a ponto de os dois jogarem xadrez juntos. Mas, eis uma reviravolta na história da prodigiosa autora, sobrinha de Allende. Dá-se uma reviravolta na política chilena. O Chile , então esquerdista, é retomado à força pelo exército, à frente o famigerado General Augusto Pinochet em golpe de estado. Agora os comunistas são perseguidos, inclusive nosso protegido de Allende. Pois em defesa de seu regime Allende é morto, defendendo seu governo e todo o regime influenciado por Fidel Castro, ditador cubano. Resultado — Dalmau de novo é repatriado para um campo de concentração por ter sido amigo de Allende.

Entrementes, espécie de entreato na epopeia de Victor Dalmau, a autora cria um suspense de amor proibido entre ele, médico já famoso, com uma dondoca de família rica chilena, cujo pai e filhos são a favor de Pinochet e contra os comunistas. É a estória de Ofélia del Soler, que se apaixona por Victor, os dois mantêm um conúbio amoroso durante muito tempo, embora o médico seja casado com Roser, mas apenas de fachada — Roser na realidade era a paixão de Guillen, irmão de Victor, morto em batalha. O romance é quebrado, Ofélia se desencanta com o conúbio proibido pela família, casa-se com antigo noivo.

 Grosso modo, este é o panorama da tragédia de Victor Dalmau, espécie de pivô do devaneio famélico criado pela Guerra Civil da Espanha e a tragédia decorrente,  astuciosamente explorado pela autora.

 

3.   Conclusão

 

Como especifiquei, não foi minha opção de leitura, o tema não me agrada, minha idade não se adunca com esse tipo de temática. Toda revolução implica em terrorismo, desordem social, capaz de gerar apopléticas discussões. Prefiro, hoje, me enternecer e acolher assuntos com temas de beleza, amor, o sentido da vida, como viver neste mundo de transformações violentas. Não me trazem benefício algum esses temas abordados .Pelo sim pelo não, para não me entenderem como espécie de pessoa blasée, só tenho que dizer o seguinte — tudo não passa de memes, invectivas de mal gosto. Isto para não ser alvo de cadeirada, agora em uso como resposta midiática.

                                                          

                                                                              Bsb, 19.09.24

 

 

 

 

sexta-feira, 6 de setembro de 2024

                               A INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL

                                  SALVARÁ   O   MUNDO?



 

           Será crível, pelo menos no nosso estágio civilizatório, que todos os problemas da humanidade serão resolvidos através da ciência? A máquina como solução salvadora capaz de atender todas as pretensões humanas, bastando ligar uma estrovenga maquínica, num passe de mágica?

                         Esse élan vital salvacionista não é de hoje, vem de priscas eras. Descobriu-se na Grécia, encontrado no fundo do mar Egeu uma geringonça, chamada de antythera, que seria nada menos que o primata do nosso computador. Vê-se que já era pretensão dos humanos alcançarem a felicidade terrena, certamente mediante os arroubos da tecnologia.

                     Mas será que o milagre da técnica alcançará tal grau de perfeição, a ponto de satisfazer todas as necessidades humanas?

                    Embora seja essa a pretensão  dos cientistas mais ousados, o mínimo que podemos alcançar seria ousarmos o patamar de um mundo possível de atendimento, aliás previsto nada menos que pelo sábio medieval Leibniz.

               O mundo impossível sonhado pela mais moderna tecnologia, que seria ultrapassar as fronteiras da técnica, tornaria a humanidade mais feliz? Dariam fim as guerras entre as nações, solucionaria a fome e a miséria existente? O ser humano se libertaria das paixões pessoais, seria melhor ou pior do que somos hoje?

              Qual seria o sentido da vida se a super tecnologia alcançasse níveis impressionantes de desenvolvimento, mas cuja perfectibilidade desobedecesse os padrões morais, éticos e estéticos?

            Ora, seríamos transformados não mais num ser humano, mas um ente transpessoal, cuja intenção seria superar a própria máquina.

           Eis o que seria esse novel ser humano, de certo equiparado a um autômato,  tendo  ainda de competir com o deslumbramento da robotização.

          Em contrapartida, talvez haja esperança de que com os últimos  avanços tecnológicos, da chamada inteligência artificial – IA, essa espécie de magia, hoje cada vez de uso impactante, o ser humano ouse atravessar a barreira do impossível, desde que obedeça  padrões de interferência éticos-morais, contenha-se com os estatutos alcançáveis de dignidade humana.

            Aliás, se nos abeberarmos melhor e nos debruçarmos com espírito mas acrítico e pragmático, nos ensinamentos da doutrina cristã, inclusive os provindos do Mestre Jesus quando nos fala de um Novo Reino a ser construído e instalação de uma Nova Jerusalem, onde, para construí-la propugnarão os que têm sede de justiça, talvez não seja uma alienação a humanidade alcançar um nível de perfeição condizente com um mundo possível de fraternidade, dignidade e justiça.

           Por assim dizer estaria certo o nosso sensatíssimo gênio que foi Leibniz quando nos predisse essa espécie de IA para um mundo realmente possível.

                                                          Bsb, 6.07.24