A INSUSTENTÁVEL DUBIEDADE DO
SER
Enquanto
Milan Kundera pontifica sua Insustentável Leveza do Ser, elucubramos
nós sobre A Insustentável Dubiedade do
Ser, isto é, quão frágil pode se tornar o caráter humano.
Desde
Platão, sobrando para seu maior discípulo Aristóteles, que o tema tem sido objeto
de reflexão. Platão ao criar a paródia da caverna para explicar o irrealismo do
ser humano, preso nas sombras de suas próprias mentes, enquanto Aristóteles,
sem desdizer o Mestre, se posiciona a favor da vitalidade do ser humano, como
alma e espírito.
Tais
parâmetros, à égide da filosofia realista platônica e do bom senso aristotélico, na verdade não têm
freado os desacertos cometidos pelo ser humano na suposta caminhada evolucionária na direção
do nada darwiniano. Pelo contrário, negando sua origem espiritual o homo
sapiens parece se apartar mais e mais da sapiência original para se comportar
como um humanoide, desprezando a ética e os valores da sapiência moral. É como
se presencia o comportamento de algumas pessoas, que acaba por se apresentar
com duas caras, justificando a teoria
das máscaras, as personas da tragédia
grega.
Como
lidar com essa duplicidade cênica, talvez seja esse o tour-de force de muitos filosóficos éticos, Emmanuel Levinas (1906-95), por exemplo, ao condicionar o humanismo
perfeito ao acolhimento do outro, na sua visão crística do ser. De resto é
problemático o convívio com esses portadores da máscara pirandélica, enleados em suas visões pessoais múltiplas e egocêntricas
— sabe-se lá resquícios dos genes egoístas, segundo as alucinações
científicas do neurobiólogo ateu Richard
Dawkins. Ou apenas faz-se representar a si mesmo nas diferentes personagens
pirandélicas no grande palco da vida?
Insuscetíveis
à crítica por assumirem a própria crítica, pessoas desse jaez, se encerram em
suas próprias redomas de vidro e se comprazem em fazer invectivas, quem sabe a
esconder dos outros o mal secreto que o atormenta — aliás, objeto do célebre
soneto do poeta maranhense Raimundo
Correia (1859-1911), de que extraímos o primeiro verso e último terceto,
ambos esclarecedores:
“Se a cólera que espuma, a dor que mora
N’alma e destrói cada ilusão que nasce,
Tudo o que punge, tudo o que devora
O coração, no rosto se estampasse.”
...................................................
“Quanto gente que ri, talvez existe,
Cuja única ventura consiste
Em parecer aos outros venturosa”.
“...Ora,
direis ouvir estrelas”, se o próprio parnasiano Olavo Bilac ouvia estrelas, para compreender o inefável, por que
nós, humílimas criaturas, que somos pó e ao pó reverteremos na visão
eclesiástica, não podemos conviver com as diferenças de nosso próximo, quando o
próprio Mestre, inocente, foi traído e abandonado pelo mundo?
CDL/Bsb, 25.05.19
CDL/Bsb, 25.05.19
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