![]() |
Bondes circulando em S.Luis-Ma |
A CIDADE ASSASSINADA - 2
Certo professor do Liceu Maranhense, quando seus
alunos não entendiam o problema de
matemática, costumava dizer — consultem
os alfarrábios. Pois hoje é o que fazemos, consultar os alfarrábios para
entendermos o que ocorre hoje com São Luís, a capital do Maranhão. O livro que
temos em mãos, já em 3ª edição, é do autor Domingos Vieira Filho, notável
folclorista, elogiado por Câmara Cascudo, Mário Souto Maior e Veríssimo de
Melo.
O livro intitula-se Breve História das Ruas e Praças de São Luís. É interessantíssimo o
teor do livro no qual o autor narra, através de pesquisa, fatos e atos
históricos das ruas e praças da cidade. É de ver-se como os prefeitos, a
maioria deles, agiam de forma até predatória para com a cidade gonçalvina.
Transformaram as ruas, despiram totalmente as praças de sua vegetação, primeiro
a título de modernização, sobretudo durante o período de interventoria, a
partir da administração de Paulo Ramos. A propósito, ele teria afirmado ...”o tecido urbano e conjunto arquitetônico
antigo são o atraso da cidade...” A
partir daí foram feitas obras de alargamento em vias centrais e a construção de
prédios, como o ocorrido com a Rua do Egito, remodelada com chalés ecléticos.
Certa feita teria dito o poeta Odylio Costa
Filho:
“O
sobrado nasce
Renasce
com o dia
Se as
vidas humanas
Lhe dão
alegria.
O
sobrado é belo
Mas sua
beleza
Sem as
vidas humanas,
Só lhe
dá tristeza.”
Ora, as razões do desmoronamento da cidade, não
há negar, vem da interventoria de Paulo Ramos, continuada pelos edis
subsequentes.
Em 1966, o jornal O Imparcial fez pesquisa
sobre porque os bondes deixaram de circular em São Luís. Os bondes começaram a
circular na cidade no dia 1º de setembro de 1872, portanto há 153 anos. Aliás, uma
das primeiras capitais do País pela iniciativa. E o que é intrigante é que a
notícia do fato quem o fez não foi nenhum repórter brasileiro, mas dois
fotógrafos americanos Allan Berner,
de Nova York e Foster M. Palmer, de
Boston. O último bonde trafegou até 1966
— asseverou Morrison.
Ao que tudo indica, os verdadeiros motivos do
desligamento dos bondes nunca foram explicados, pelo menos de forma
compreensível. Sabe-se que em 1946, o então presidente Eurico Gaspar Dutra
decretou o fim das operações da ULEM, operadora dessas funções no País. Na
década de 1960, durante o governo de José Sarney, certa empresa chama Fontec,
contratada para organizar o trânsito na capita,l declarou “que os
bondes causavam transtornos no tráfico”. E os bondes deixaram de operar em
São Luís.
Como assim transtorno, se em
muitas cidades os bondes até hoje
continuam circulando, como em São
Francisco, Califórnia, EUA, em Lisboa e Porto, Portugal?
A propósito, o turismo que utiliza tanto o bonde, é praticamente nulo em São Luís, fato inclusive ignorado pela rede hoteleira da capital, que
parece desconhecer ou desvalorizar as belezas naturais dos Lençóis Maranhenses
ou as belezas naturais, descobertas em Tutoia, foz do rio Parnaíba. Para essas
autoridades, turismo no Maranhão é valorizar a cidade colonial, supor que os turistas querem ver são os antigos
casarões da cidade, dita fundada pelos franceses. Ora, na realidade, hoje só se encontram ruínas,
casarões abandonados, os famosos azulejos portugueses desfigurados, aqueles
palácios dos antigos portentosos moradores, agora são abrigos de ratos, um
verdadeiro lixo. E o que é pior, ninguém reclama, inclusive os próprios
políticos, enquanto casas, ruas inteiras jazem em completo abandono — sacadas
românticas de antanho desabam em monturo.
Aliás, esse estado de abandono dos políticos,
edis sobretudo, ao Maranhão não vem de
hoje. Basta lermos as crônicas reunidas em seu livro O Jornal de Timon de João Francisco Lisboa, escritor e jornalista,
hoje bicentenário, protagonista da cultura, aluno de Sotero dos Reis e amigo de
figuras notáveis como Odorico Mendes, tradutor da Odisseia de Homero, também do poeta indianista Gonçalves Dias. Ali,
ele critica de forma contundente os políticos maranhenses, à época da Regência
e do Primeiro Reinado. Esse estado de coisa vige até hoje.
A exemplo de Ouro Preto, Minas, São Luís foi
tombada pela UNESCO em 1974, cuja finalidade era proteger seu patrimônio
cultural, preservando bens de valor histórico, arquitetônico e ambiental, entre
outros, de modo a evitar sua destruição e descaracterização. Ora, no caso de
São Luís parece que o tombamento, em vez de proteger, fez levar a cidade, em
alguns caso, à ruina e sua
descaracterização, a exemplo do que ocorreu no Campo do Ourique, totalmente modificado, pior, destruído o belo
arvoredo circundante.
E os bondes, por que retirá-los, uma das
maiores características de São Luís? Aliás, como o é em S. Francisco, na
Califórnia, EUA, em Lisboa e Porto em Portugal?
O turismo no Maranhão sempre foi precário,
para dizer o mínimo. Se a finalidade do tal tombamento foi preservar os bens
culturais da cidade — os bondes não contribuiriam para o turismo, possibilitando o deslocamento dos
turistas aos sítios históricos e bens antigos?
Que fossem abolidas as demais linhas de bonde
na cidade, para atender os caprichos da modernidade, segundo o juízo dos
políticos, mas que pelo menos duas linhas seriam conservadas — o bonde Gonçalves Dias e o da Estrada de Ferro. O primeiro devido
roteiro interessante, parte da Praça Gonçalves Dias, percorre as ruas da Paz,
passa pela largo da Igreja de São João e
desce pela rua do Sol, ladeia a Praça João Lisboa, alcança a Praça Benedito
Leite e por fim termina na Av. Pedro II. O segundo bonde, Estrada Ferro, seu
percurso é ladear a chamada cidade alta, passando pela antiga Estação de Trem,
transpondo, até de forma romântica toda a Beira Mar com casario arte nuveau e
descer até o porto e depois subir
dando uma volta no Cemitério e
enfim aportar a seu ponto final,
oferecendo uma vista panorâmica da cidade.
Certa feita, o Pe. João Mohana, autor
maranhense consagrado pelos seus dois livros O Outro Caminho e Maria da
Tempestade fez a seguinte observação de que uma das coisas que mais o
fascinava, quando estava em São Luís, era dar uma volta no Bonde Gonçalves
Dias.
Os políticos maranhenses, seus edis
principalmente, ao desligarem o tráfego pelo menos desses dois roteiros de
bonde — não há negar, tornaram-se os mais recentes algozes do assassínio
cometido à suposta capital francesa
fundada por Lá Ravardière, na realidade, segundo alguns historiadores, a antiga
aldeia portuguesa de Rosário.
Bsb, 22.04.25
Nenhum comentário:
Postar um comentário