segunda-feira, 31 de julho de 2023

 

FUNDAÇÃO E O FUTURO GALÁCTICO

 

 

Depois da explosão midiática do filme DUNA, criada por Frank Herbert, surge outra sensação com a série FUNDAÇÃO, esta baseada no famoso escritor de FC Isaac Asimov, nascido russo. Dizem que Herbet teria se inspirado em Asimov, mas divergiu no desenrolar de sua trama. A nosso ver Tolkien  superou os dois por sua profundidade espiritual e filosófica.

Falemos, pois, sobre FUNDAÇÃO, no momento na berlinda. Não nos é desconhecido o conceituado autor de FC, Isaac Asimov e sua vasta obra — dizem os críticas de cerca de 500 escritos, entre romances, contos, ensaios e outros. Vale dizer que outros autores também foram notáveis nesse ramo de ficção — H.G.Wells, Phillip Dick, Júlio Verne, Ursula K.Gun, William Gibson, Margaret Atwood, Arthur C. Clarke, Aldous Huxley, Ray Bradbury, segundo a Wikpédia.

É sabido que nada há de novo em termos de criação literária, haja vista os alfarrábios — costumava dizer um antigo professor — com os escritos de Homero, Miguel de Cervantes, Luís de Camões e tantos outros que iniciaram as sementes das letras com suas inventivas.

Críticos há que Asimov criou sua utopia galáctica influenciado pelo historiador inglês Edward Gibbon (1737-94), autor de A História do Declínio e Queda do Império Romano, este por sua vez inspirado noutra obra de Montesquieu Grandeur et Décadence des Romans.

Asimov, vale dizer, graduou-se em bioquímica, depois em medicina, tendo sido professor catedrático. Sem nos arvorar de defensor da FC, mas leitor assíduo dos antigos quadrinhos da revista Gury, com suas estórias fantásticas, ai pelos anos 40, podemos falar de cátedra sobre sagas galáctica, como esta de Asimov, sobretudo em face do mundo atual. Considere-se que a trilogia FUNDAÇÃO foi escrita por volta de 1940.

Dispensemo-nos de interpretar ipsis litteris a obra — que o façam os intérpretes da grande mídia ansiosa por novidade. Preferimos falar sobre as ideias centrais de FUNDAÇÃO, o que moveu o autor a transplantar, para o futuro do universo, fatos, e atos do vivenciamento humano de nosso tempo, os imbróglios políticos que hoje nos envolvem a todos. Asimov imaginou que o desenrolar dos acontecimentos decorrem do comportamento de pessoas, grupos e sociedades, passíveis de imperfeições, podem influenciar o futuro, isto é, transformar, mal ou bem, a história — espécie de ciência que ele designou como psico-história. Hali Seldom seria o matemático que ousou manipular os dados da aventura humana no tempo e no espaço, de tal sorte que poderia prever o futuro do mundo, no caso dos impérios galácticos. A trilogia de  Asimov se passa muitos anos após a nossa era e no centro do universo galáctico.

Vale lembrar que, sobre essas populações galácticas, Camile Flamarion, escritor francês, amigo de Alan Kardec, o criador do espiritismo, publicou o livro Pluralidade dos Mundos Habitados, em 1861, no qual descreve a vida dessas habitantes — de certo baseado nas palavras do Mestre em João 14:2 : “Na casa de meu Pai há muitas moradas”.

Se nos determos sobre a história de Roma e seu formidável Império, vemos como foi destruído e as causas de seu desabamento são várias, internas e externas, invasões bárbaras, divisão interna, crises econômicas, sem falar no fato que foi decisivo para o declínio e desaparecimento do império — o crescimento inevitável do cristianismo. Como disse um antigo professor nosso: “As civilizações nascem, crescem e morrem”. Roma caiu pelos erros e pecados cometidos, atrocidades monstruosas, como foram destruídas Sodoma e Gomorra.

Não nos parece outra senão essa a visão de Asimov em sua FUNDAÇÃO, em que reproduz, com todos os artefatos e espalhafatos criados pela tecnologia, ao  utilizar todos os aforismos do formidável cientificismo — como esse dessa neociência: a psico-história. O tal Império Galáctico, controlado por um núcleo central extremamente ditatorial chamado FUNDAÇÃO, a que se sujeitam todos os demais  núcleos galácticos, nada mais é que Roma e seu brutal domínio sobre as regiões conquistadas. Entrementes, nesses núcleos explodem lutas fratricidas, inveja, vingança, em busca do poder, as populações em combate contínuo para se libertarem da tirania exercida pela FUNDAÇÃO. Na cerne da tal Fundação, reina a decidia, o exercício do  poder tirânico. Tudo isto como o foi e se caracterizavam os imperadores romanos — Nero, Calígula e demais monstros da história de Roma.

Assim, percebe-se que a variante galáctica de Asimov, com as devidas proporções de lugar e tempo, não passa de uma nova e mais atualizada versão do maneirismo ideológico utilizado no século XVIII por Gibbon, ao descrever o declínio e a queda antológica do Império Romano.

No cenário idealizado por Asimov, nas galáxias impera o mesmo sistema utilizado pelas nações e comunidades de nosso tempo, assim como o fizeram no passado, a prevalecer a autonomia do mais forte, a luta famigerada pelo poder, o furor dos ditadores e o exagerado acúmulo das grandes fortunas, controladoras do mundo.

Em nossos dias, vemos a trilogia criada por Isaac Asimov ultrapassar os livros e ser lançada nas telas de cinema e TVs, com artefatos estapafúrdios, criados pela mais moderna cinematografia,  com os mais estupendos efeitos especiais até agora produzidos pela computação eletrônica. Parece ousar superar outras fantásticas produções como Duna (2021), Matrix (2021), Blade Runner(2017), Interstellar (2014), Senhor dos Anéis (2001), Uma Odisseia no Espaço (1968), Planeta dos Macacos (1968) e Star Trek (1966).

Embora fã da Ficção Científica desde menino, encantado com os fantásticos quadrinhos da antiga revista Gury e dos desenhos insuperáveis de Alex Raymond em seu Flash Gordon — sempre nos causa espécie que em todas as gerações de FC, as de ontem e  de hoje, antigas ou modernas, não haja, em todo o desenrolar de seus enredos, a existência magnânima de Deus, o Criador supremo do Universo.

                                             Bsb, 31.07.23

 

domingo, 9 de abril de 2023

 

ENRAIZAMENTO E PERSONALISMO

   DUAS    OPÇÕES    CRÍSTICAS

 

 


 

CLARÃO na noite escura de nossa realidade, quase insana — eis o que nos representam as obras de dois singulares filósofos Simone Weil e Emmanuel Mounier, ambos franceses. Sobre a filósofa, há um movimento visando levá-la à beatificação, não apenas por sua obra filosófico-religiosa — mas sobretudo pelo desenvolvimento de sua espiritualidade de viés católica, embora nunca tenha sido convertida à Igreja em vida. Sabe-se que ela foi batizada ao morrer por uma amiga, a seu pedido.

É o espelho de sua obra refletido no descortino de sua vida que a elegeu à condição de beatitude. Sua personalidade ínclita, entretanto não demonstra familiaridade ao modelo das santas propriamente ditas da Igreja, capazes de milagres.

Tirante tal singularidade, o que nos espanta e nos faz acreditar em Simone é sua postura perante a fé crística — não propriamente  na ortodoxia prevalente no Vaticano, mas aquela oriunda da Patrística, nos ditames primordiais em que se fundou a Igreja como representante original dos ensinamentos de Jesus Cristo.

Simone, embora assumidamente sem religião, parece firmar-se nas verdades doutrinárias da redenção da humanidade, não através de exagerado pietismo, mas da reforma dos seres humanos que se abeberem nas fontes primaciais da Sabedoria, da Justiça e do Amor. Ela preconiza o retorno ao culto a Deus Criador e Provedor Único do Universo. Ele próprio encarnado na Transcendência, com que se distingue de um simples dispenseiro existencial, a perdoar pecados e atender os mais diversos pedidos de uma humanidade pecadora, a queixar-se de seus sofrimentos, espécie de Grande Pai do Céu atendendo pensares e pesares de seus filhos.

O Deus de Simone é um Deus de superioridade infinita que administra o Universo e toda criatura nele inscrita. É o que rezam as Escrituras, a partir de sua estrutura abrâmica, a perder-se no tempo e no espaço. Eu Sou Aquele Que Sou — capaz de estruturar e desestruturar sua Obra Criada, à égide de sua Sabedoria,  Justiça e Amor, epítomes de sua Transcendência.

Perguntar-se-á: em que consiste afinal a filosofia simoneana, capaz de  reconstruir a fé no  mundo ocidental, hoje tão abalada?

O acervo filosófico de Simone Weil é relativamente extenso, considerando sua curta vida, falecida com apenas 34 anos de idade. Mas, uma de suas obras, por sinal inacabada com sua morte — O Enraizamento — a nosso ver, parece a que mais anuncia a chave de seu método original de recuperação da religiosidade, o que ela considera espécie de propedêutica do enraizamento. Segundo a filósofa, a modernidade desgovernou-se através do cientificismo, saturado de pragmatismo, para ela, responsável pelo desvio da humanidade da fé verdadeira, estiolando a sociedade dos valores axiológicos arraigados nos preceitos de Jesus Cristo, com que se subvertem a Justiça, a Moral, a Sabedoria e o Amor.

Trata-se de um ensaio de 1943, inacabado, cujo subtítulo é Prelúdio Para uma Declaração dos Deveres para com os Seres Humanos. No ensaio ela cria as bases de uma doutrina, capaz de expressar os princípios que permitiriam as civilizações perdurarem, desde que apoiadas no bem absoluto que habita o coração do ser humano, mas originário de uma realidade fora do mundo. Ou nas suas palavras: “O Enraizamento talvez seja a necessidade mais importante e mais ignorada da alma humana (...). Todo ser humano precisa ter múltiplas raízes, precisa receber a quase totalidade de sua vida moral, intelectual, espiritual, por intermédio dos ambientes a que naturalmente pertence.”

Ocorre que Simone Weil tem uma aliado às suas ideias. Coincidentemente é também francês e filósofo — Emmanuel Mounier. Nascido em 1905, falecido em 1950, quatro anos após o falecimento de Simone que provavelmente nunca se encontraram. Ele jornalista, criador da revista Esprit e ela envolvida com a vida operária, tendo participado da Guerra Espanhola. Ambos tinham ideias similares: defendiam o cristianismo, combatiam o comunismo e o capitalismo predador e se empenharam no combate ao hitlerismo e a ideologia  antijudaica, criadora da fatídica solução final que sacrificou milhões de judeus nos fornos nazistas, cujos fatos causaram a deflagração da 2ª Guerra Mundial.

Enquanto Simone Weil indicava o retorno ás fontes primevas do cristianismo, a Patrística e seus grandes mentores, Mounier sustentava o personalismo  como opção filosófica, a reunir duas ideologias, o liberalismo e o marxismo, visando superar os dois males. Para Mounier e também Weil, a democracia por si só não seria a solução, a não ser que se atentasse para a dimensão espiritual     visando o bem da pessoa humana integralmente. Para Weil, o ser humano precisa manter raízes morais, intelectuais e espirituais nos ambientes em que vivem para obter seu aperfeiçoamento. De sua vez, Mounier defende, baseado na tradição cristã, o que ele denomina a propriedade humana, em busca de um projeto para uma sociedade mais justa e solidária.

Ambos têm um ponto comum, suas proposição não apresentam cunho político, embora haja certos ingredientes políticos, tanto no personalismo quanto no enraizamento.

Como credores que somos  da melhoria da democracia vigente, tais aspectos dão motivos a que se façam reflexões mais realísticas sobre esse regime, visando torná-la mais livre, participativa e sua execução enseje de algum modo o aperfeiçoamento do ser humano.

 

CDL/ Bsb, 9.04.23

domingo, 26 de março de 2023


 

A  MAIS NOVA FÁBULA DE ESOPO

 

 

Um sapo, mediante esperteza, tornou-se o Sapo-Rei numa grande grei de saparia.

— Agora que sou o Rei, todos os sapos vão me obedecer.

A partir daí o reino dos sapos faziam o queria o Grande Sapo-Rei.

— Não quero mais ver sapo rico — disse ele em discurso.

E todos os sapos afortunados que acumularam seus bens com esforço e trabalho têm seus bens confiscados. Todos os sapos foram igualados e, por isso, nenhum tinha mais vontade de trabalhar no reino da sapatada.

— Os sapos agora vão trabalhar para o Grande Reino dos Sapos.

E todos os sapos se tornaram escravos no Reino da Saparia, sob o tacão rigoroso do Grande Rei-Sapo.

Só ele, e seus asseclas, podia ter luxo no seu grande charco. Até a quantidade de insetos, que os sapos deviam comer, ficou definida.

Mas um dia, depois de tantos absurdos do Grande Sapo-Rei, um grupo de sapos, mais valentes, resolveu fazer uma rebelião. Mas o Grande Sapo-Rei usou seu prestígio, sua força e poder absoluto. Mandou matar todos os revoltosos.

E tudo voltou a ser como dantes, no reino daqueles pobres sapos cantantes.

Moral da estória:  a tirania reina na mesma medida que prevalece a covardia dos oprimidos

CDL/Bsb. 26.03.23