A SABEDORIA DA FÉ
O mundo atual tem se ressentido da falta de fé, em todos os
sentidos. Podemos dizer que os seres humanos são sobreviventes de crises, crise
de razão e também de fé. E, pasmemo-nos todos: a mídia vem contribuindo
diuturnamente para esse descalabro, na medida em que informa mal ou, no mínimo
errado. É o que se depreende de artigos da revista Veja, edição de 23.08.17,
último, intitulados “Decadência Sem
Elegância”, do articulista Fábio Altman e “A Crise das Crises”, de Joel Pinheiro da Fonseca. Os dois
comentaristas se apressam tão somente a apresentar o problema da Fé, tendo como
paradigma dois escritores, que, segundo eles estão na mídia: Michel Onfray, filósofo francês ateu e Roger Scruton, também filósofo, inglês,
professor, dito conservador.
Explique-se que
essa revista é vezeira – assim como outras da mesma linha – em informar apenas
as aparências, desprezando o substancial. Desse modo, acaba desinformando o
leitor. É assim que no primeiro artigo, Onfray, o primeiro dos expositores
sobre a Fé, é-nos apresentado como uma espécie de pequeno herói da filosofia,
quando afirma: “Na França, a busca por um
intelectual que sirva de consciência da nação é incessante. O nome
incontornável, hoje, é Michel Onfray”. Há alguns anos a Veja fez uma entrevista (páginas
amarelas) com esse suposto e esdrúxulo pensador francês onde declara que Paulo,
o Apóstolo que divulgou a Boa Nova de Jesus Cristo, tinha ardores de misoginia,
dando a entender, em razão disso, que
tinha comportamento homossexual. Ora, isso é o maior dos aleives, pois Saulo,
depois Paulo, foi casado e tinha até filho. O artigo torna-se capcioso, talvez
pelo fato de o próprio homenageado ser controverso, o pensamento tortuoso,
diríamos um novel Nietzsche, totalmente delirante, que, a nosso ver, não passa
de um sátrapa moderno travestido de filósofo. E mais: o artigo nada explica,
mas põe em evidência, por exemplo, declaração como esta desse Sr. Onfray: “Uma civilização não produz religião, é a
religião que produz a civilização.” Isso para comprovar, no bestunto desse
senhor, que o pensamento ocidental judaico-cristão é puro delírio. É claro que
a religião não só disseminou, como produziu os fundamentos da nossa
civilização, ultrapassando seu primitivismo, despertando-a do estado de
inconsciência vivida, para o da consciência do real concreto. O problema é que
isso o artigo não faz transparecer. E outras baboseiras, ditas por ele,
absolutamente inconsistentes, como a inexistência de Jesus histórico e a
comparação da fé cristã com o islamismo jihardista.
Já em “A Crise das Crises”, Joel Pinheiro da
Fonseca, depois de repetir algumas aleivosias de Onfray, sem, contudo, penetrar
a fundo para não bater contra o artigo
anterior, o tour de force é seu desafeto, o filósofo inglês, professor e
autor de vários livros de estética, política e filosofia, Roger Scruton, tido como o autor mais conservador da atualidade. Também não esclarece grande coisa sobre o
escritor, senão algumas citações descontextualizadas, extraídas de sua última
obra “A Alma do Mundo”.
Observe-se que o
articulista é da mesma forma superficial, colhe citações ao acaso e
subliminarmente satiriza o autor quando escreve: “A fé de Scruton tem seu charme, mas é acima de tudo uma atitude
pessoal — um abrir-se ao mundo de significados humanos – e não a crença literal
numa verdade que está além da razão.”
E mais adianta
completa: “...Tanto é assim que Scruton
estende sua fé mesmo a agnósticos e ateus.”
A ideia que
resta ao pobre leitor desinformado é que Roger Scruton não passa de um desses
filósofos de balcão, colecionador de bordões midiáticos, tal qual o é seu
suposto desafeto Michel Onfray.
Ora, o que os
dois artigos da revista não explicam é justamente o essencial da questão: o que é a Fé e porque o mundo está perdendo
a Fé. Para Onfray ela é o empecilho, sim, porque ele é ateu, não acredita
no Criador, em Jesus Cristo, o Mestre, o qual, para ele, nunca existiu, não
passa de um mito cristão. Já Scruton, imbuído da filosofia católica, filósofo e
pesquisador incansável em defesa do acervo civilizatório que nos legou o
cristianismo, reconhece, ao contrário, que a salvação do mundo radica-se na Fé.
Sim, porque a Fé é o fundamento em que se enraíza toda a propedêutica cristã,
isto é, a aceitação das verdades
reveladas e a confiança em Deus como
fiador eterno de suas promessas.
Para não nos delongar
mais, pois o assunto pervaga instâncias outras como filosofia, teologia e
ciência, resta-nos esclarecer alguns pontos, falhos nos dois artigos da Veja. A
Fé, tirante significar a aceitação de uma
ideia ou regra, indemonstrável
intuitiva ou teoricamente, (conforme verbete “Dicionário de Filosofia”, de Thomas Ransom Giles) – o que nesse
caso , estaríamos no terreno mais laico – do ponto de vista religioso, não há
definição melhor do que a de São Paulo, Hebreus 11:1: “A fé é o fundamento da esperança, é uma certeza a respeito do que não
se vê.” Portanto, cai por terra o argumento do sr. Onfray de que a Fé é o empecilho
da civilização, pelo contrário, foi essa mesma Fé que fomentou o nascimento do cristianismo,
tornando-se também o vetor responsável pelo progresso da civilização, antes
envenenada pela barbárie, degeneração dos costumes e incentivo à amoralidade
social e política.
E se o mundo
atual está perdendo a Fé, segundo denuncia com razão Scruton, é justamente porque este nosso mundo
tem se afastado dos fundamentos da religião, isto é, da Fé na qual se funda a
esperança, pois, independente do que pensa o ateu Onfray e outros seus
compartícipes dessa teoria negativa, nós, seres humanos, sem esperança não
passaremos de espetros a viverem por viver, sem nada em que se apegar e
confiar, como já preconizava o velho e sábio Montesquieu.
CDL/Bsb 4.09.17